Como funciona a Ressaca?

Introdução


Não é segredo que a embriaguez tem inúmeras conseqüências negativas imediatas. Entre outras coisas, ela prejudica a capacidade de julgamento e a capacidade de exercer diversas atividades - e pode levar a um estado de depressão. Mesmo depois que a pessoa volta a ficar sóbria o álcool ainda pode causar problemas ao organismo. Mais de 75% dos consumidores de álcool tiveram uma ressaca pelo menos uma vez; 15% têm uma ressaca pelo menos uma vez ao mês, e 25% dos estudantes universitários sentem os efeitos de uma ressaca uma vez por semana.


Neste artigo, explicaremos o que causa os sintomas da ressaca e examinaremos a ciência dos métodos de prevenção populares e a cura para o dia seguinte.


O que é uma ressaca?


O nome formal adotado nos EUA para uma ressaca é veisalgia, que tem origem na palavra norueguesa para "mal-estar depois da orgia" (kveis) e na palavra Grega para "dor" (algia), um nome apropriado considerando-se os sintomas desconfortáveis sentidos pelas pessoas que bebem. A ressaca comum inclui alguns dos ou todos os seguintes sintomas:


- Dor de cabeça
- Mal-estar
- Sensibilidade à luz
- Diarréia
- Perda de apetite
- Tremor
- Náusea
- Fadiga
- Aumento dos batimentos cardíacos e da pressão arterial
- Desidratação (boca seca, sede extrema e olhos ressecados)
- Problemas de concentração
- Ansiedade
- Dificuldade para dormir
- Fraqueza


Os sintomas mais comuns são a dor de cabeça, a fadiga e a desidratação, e o menos comum é o tremor. A gravidade e o número de sintomas variam de pessoa para pessoa. No entanto, quanto mais álcool for consumido, pior será a ressaca.


Geralmente são necessários de 5 a 7 doses, no período de quatro a seis horas, para causar uma ressaca em uma pessoa que bebe pouco ou de forma moderada (um homem que beba até três doses de bebida alcoólica por dia ou uma mulher que tome até uma). Um grande bebedor é capaz de ingerir uma quantidade maior de álcool devido a uma maior tolerância. Além da quantidade de bebida consumida, a ressaca pode se tornar pior por:


- Beber com o estômago vazio
- Falta de sono
- Aumento da atividade física enquanto bebe (dançar, por exemplo)
- Desidratação antes de beber
- Saúde precária


Ainda não se conhece totalmente a causa de alguns desses sintomas, mas pesquisas têm proporcionado aos cientistas grande conhecimento sobre os principais efeitos causados por uma ressaca. Nas próximas seções, descobriremos o que acontece no organismo.


Biologia de uma ressaca: inibição de uma vasopressina


Quando o álcool é consumido, ele entra na corrente sangüínea e faz com que a hipófise no cérebro bloqueie a criação da vasopressina. Sem esta substância química, os rins enviam a água diretamente para a bexiga ao invés de reabsorvê-la no organismo. É por isso que quando o álcool é ingerido, a diurese aumenta.


De acordo com estudos, ingerir por volta de 250 mililitros de bebida alcoólica faz com que o corpo expulse de 800 a 1000 mililitros de água; uma relação de quatro vezes mais perda do que ganho. Este efeito diurético é menor depois que o álcool diminui na corrente sangüínea, mas os efeitos colaterais ajudam a criar a ressaca.


Na manhã seguinte de uma grande bebedeira, o corpo envia uma mensagem desesperada, solicitando que seu suprimento de água seja reposto, geralmente manifestada por uma sensação de boca seca.


A urina expele sais minerais e potássio que são necessários para o funcionamento adequado dos nervos e músculos ; quando os níveis de sódio e potássio ficam muito baixos, surgem as dores de cabeça, fadiga e náusea. O álcool também destrói a reserva de glicogênio no fígado, que é quebrado em glucose e enviado para fora do corpo sob a forma de urina. A falta desta fonte de energia é, em parte, responsável pela fraqueza, fadiga e falta de coordenação na manhã seguinte. Além disso, o efeito diurético expele eletrólitos vitais, como o potássio e o magnésio, que são necessários para o funcionamento adequado das células.


Tipos diferentes de bebidas alcóolicas podem causar diferentes tipos de ressaca.


A biologia de uma ressaca: resíduos tóxicos


Vinhos escuros e licores tem um nível mais alto de certas toxinas


Tipos diferentes de bebidas alcóolicas podem resultar em diferentes sintomas de ressaca, pois algumas bebidas alcoólicas têm uma concentração mais alta de toxinas, que são subprodutos da fermentação.


A maior quantidade destas toxinas é encontrada no vinho tinto e bebidas escuras como o bourbon, o brandy, o uísque e a tequila. O vinho branco e as bebidas claras como o rum, a vodca e o gim têm menos toxinas e portanto causam ressacas menos graves. Em um estudo, 33% das pessoas que beberam uma determinada quantidade de bourbon relativa ao seu peso, registraram uma ressaca grave, comparados aos 3% que beberam a mesma quantidade de vodca.


Bebidas alcoólicas diferentes (cerveja, vinho, destilados, etc.) têm substâncias diferentes quando combinadas, e podem resultar em sintomas de ressaca bastante graves. Além disto, a carbonatação da cerveja apressa a absorção do álcool. Como resultado, beber cerveja depois de outra bebida não dá ao corpo o tempo necessário para processar as toxinas.


A biologia de uma ressaca: o acetaldeído


Um produto do metabolismo do álcool que é mais tóxico que o próprio álcool, o acetaldeído é criado quando o álcool no fígado é destruído por uma enzima chamada álcool-desidrogenase. O acetaldeído é então atacado por outra enzima, o aldeído-desidrogenase, e por outra substância que se chama glutationa, que contém uma quantidade alta de cisteína (uma substância que é atraída pelo acetaldeído). Juntos, o aldeído-desidrogenase e a glutationa formam o acetato (uma substância similar ao vinagre) não tóxico. Este processo funciona bem, deixando ao acetaldeído apenas um curto período de tempo para fazer seu estrago, se apenas alguns coquetéis forem consumidos.


Infelizmente, os estoques de glutationa no fígado esgotam-se rapidamente quando quantidades maiores de álcool são consumidas. Isto faz com que o acetaldeído se acumule no organismo, enquanto o fígado produz mais glutationa, deixando a toxina no organismo por períodos de tempo mais longos. Em estudos que bloquearam a enzima que destrói o acetaldeído (aldeído-desidrogenase) com um medicamento chamado Antabuse (em inglês), projetado para acabar com o alcoolismo, a toxidade do acetaldeído provocou dores de cabeça e vômitos tão graves que contra-indicam o seu uso. A questão do peso é um dos motivos pelos quais as mulheres não devem acompanhar os homens na bebedeira, pois as mulheres têm menos aldeído-desidrogenase e glutationa, fazendo com que o organismo leve mais tempo para eliminar as toxinas, piorando os efeitos da ressaca.


Alguns dos sintomas mais comuns da ressaca, como a fadiga, irritação do estômago e uma sensação geral de mal estar, podem ser atribuídos também a algo chamado de reação à glutamina. Na próxima seção, saberemos o que isso significa.


A biologia de uma ressaca: reação à glutamina


Depois de exagerar no consumo de bebida alcóolica, o indivíduo não consegue dormir tão bem como o faz normalmente, pois o corpo está reagindo ao efeito depressivo do álcool no organismo. Quando alguém está bebendo, o álcool inibe a glutamina, um dos estimulantes naturais do organismo. Quando o indivíduo pára de beber, o organismo tenta compensar o tempo perdido, produzindo mais glutamina do que precisa.


O aumento nos níveis de glutamina estimula o cérebro enquanto a pessoa tenta dormir, evitando que os níveis mais profundos e saudáveis do sono sejam atingidos. Isto contribui muito para a fadiga sentida em uma ressaca. A ação da glutamina durante uma ressaca também pode ser responsável por tremores, ansiedade, agitação e aumento da pressão arterial.


O álcool é absorvido diretamente através do estômago, por isso as células que o recobrem ficam irritadas. O álcool também provoca a secreção de ácido clorídrico no estômago, eventualmente fazendo com que os nervos enviem ao cérebro a mensagem de que o conteúdo do estômago está machucando o corpo e precisa ser expelido através do vômito. Este mecanismo pode, na verdade, diminuir os sintomas da ressaca a longo prazo, pois livra o estômago do álcool e reduz o número de toxinas com as quais o organismo tem que lidar. A irritação do estômago também é responsável por outros sintomas desagradáveis da ressaca, como a diarréia e a perda de apetite.


Agora sabemos porque o álcool causa as ressacas. Nas seções seguintes, falaremos sobre a ciência por trás das "curas" comuns para a ressaca.


Remédios de comida e bebida - fato ou ficção?


As curas para a ressaca incluem tudo, desde "fogo se rebate com mais fogo" (beber um pouco mais de álcool na manhã seguinte), uma torrada queimada com café preto até remédios comprados sem receita médica. Quais, dentre todas as curas propostas realmente funcionam?


Fogo contra fogo


Ao contrário da crença popular, "fogo contra fogo" apenas adia o inevitável. Um dos motivos pelos quais as ressacas são tão desagradáveis é que o fígado ainda está processando as toxinas que sobram do metabolismo do álcool. Beber mais álcool pode fazer com que os sintomas pareçam diminuir, mas apenas fará com que a situação piore assim que o fígado metabolize o álcool, pois terá ainda mais toxinas para processar.


Conclusão: FICÇÃO 


Torrada queimada


De cara, a torrada queimada pode parecer verdadeiramente baseada em fatos científicos. O culpado dessa mentira é a parte queimada do pão torrado, em uma analogia com o carvão. O carvão age como um filtro no organismo. Por mais verdadeiro que seja que o carvão ativado é usado para tratar alguns tipos de envenenamento, ele não é usado, para curar a intoxicação por álcool, algo muito diferente de uma ressaca comum.


Comumente, o efeito de filtragem do carvão está por trás do sucesso dos medicamentos vendidos sem receita tomados antes de se começar a beber. Os fabricantes defendem que o carvão ativado nas drágeas "atrai" as toxinas.


A parte queimada do pão torrado não é a mesma coisa que o carvão ativado e tampouco equivale a tomar um remédio para ressaca.


Conclusão: FICÇÃO


Café preto


O café contém uma quantidade elevada de cafeína, que é um estimulante e portanto ajuda a acabar com a fadiga. Mas quando a cafeína se esgota, o indivíduo pode ficar ainda mais cansado do que antes. Ela pode ajudar a aliviar uma forte dor de cabeça, pois é um vaso-constritor, o que significa que reduz o tamanho dos vasos sangüíneos, neutralizando os efeitos do álcool, que ao contrário, faz com que eles fiquem dilatados, causando a dor de cabeça. Infelizmente, a cafeína também é um diurético como o álcool e pode fazer um indivíduo ficar ainda mais desidratado do que antes, aumentando assim a gravidade dos efeitos da ressaca. Geralmente, o café não é bom para a ressaca.


Conclusão: FICÇÃO 


Alimentos fritos ou gordurosos


A ingestão de alimentos fritos ou gordurosos na manhã seguinte irá, provavelmente, causar uma irritação maior no estômago do indivíduo. Comê-los antes de beber pode, na verdade, ser útil. Qualquer coisa que você coma antes de exagerar na bebida, ajuda a prevenir uma ressaca. Os alimentos gordurosos grudam no estômago, fazendo uma cobertura mais duradoura e, portanto, diminuindo a absorção do álcool pela corrente sangüínea. Isto pode fazer com que os efeitos do álcool levem mais tempo para serem sentidos, dando ao organismo mais tempo para processar as toxinas. Tanto é assim que, uma tática dos habitantes de países mediterrâneos é tomar uma colherada de óleo de oliva antes de ingerir bebida alcóolica. Ingerir alimentos mais leves, como um sorvete ou uma fruta, fornece energia e alivia alguns dos sintomas, repondo os eletrólitos que o organismo perdeu pela desidratação.


Conclusão: FATO - para a prevenção; FICÇÃO - para cura


Ovos


Comer ovos na manhã seguinte dá energia como qualquer outro alimento. Mas os ovos também contêm grande quantidade de cisteína, substância que ataca o acetaldeído (a toxina que causa a ressaca) na glutationa esgotada no fígado. Portanto, os ovos podem ser uma ajuda em potencial para limpar as toxinas que sobram.


Conclusão: FATO 


Bananas


Comer bananas na manhã seguinte de uma noite de muita bebedeira supre os eletrólitos perdidos como qualquer alimento, mas também reabastece especificamente o potássio perdido pelo efeito diurético do álcool. Outros alimentos ricos em potássio como o kiwi ou bebidas esportivas também funcionam.


Conclusão: FATO


Água


Consumir bastante líquido depois de uma noite de bebedeira combate a desidratação e ajuda a diluir as toxinas que sobram no estômago. Acrescentar sal e açúcar à água vai ajudar a substituir o sódio e o glicogênio perdidos na noite anterior. Bebidas esportivas descafeinadas e sem gás, podem produzir o mesmo efeito.


Como método preventivo, beber um copo de água para cada drink diminui a ingestão da bebida, dando mais tempo ao organismo para lidar com o álcool (o organismo pode processar apenas cerca de 20 mililitros de álcool em uma hora). Beber alguns copos de água antes de ir para a cama combate a desidratação depois que o organismo termina de destruir o álcool.


Conclusão:  FATO  - para a prevenção e cura


Suco de fruta


A frutose, ou acúcar de frutas, contida nos sucos ajuda a aumentar a energia do organismo. Estudos provaram que ela também aumenta a proporção de limpeza de toxinas do organismo, resultantes do metabolismo do álcool. O suco de frutas também é uma boa idéia na manhã seguinte porque tem alto teor de vitaminas e nutrientes que foram perdidos na noite anterior pelo efeito diurético do álcool. Suplementos vitamínicos com alto teor de vitaminas C e B também são eficazes.


Conclusão:  FATO 


Analgésicos


Alguns analgésicos podem ser mais eficazes do que outros ao combater uma ressaca. Misturar analgésicos com cafeína pode ajudar a aliviar a dor de cabeça porque combina um analgésico na fórmula (mas a cafeína não tem efeito benéfico no tratamento da ressaca). O acetominofeno em altas doses pode lesar o fígado e, por isso, deve ser evitado.


A aspirina é um analgésico sem cafeína e também é uma classe de medicamento antiinflamatório conhecido como inibidores de prostaglandinas. Altos níveis de prostaglandina têm sido associados ao aumento na gravidade da ressaca. Em um estudo, participantes que tomaram um inibidor de prostaglandina antes de deitarem, relataram dores de cabeça menores, menos náusea e sede do que aqueles que beberam a mesma quantidade de álcool, mas não tomaram o inibidor de prostaglandina. Se você, no entanto, tem um estômago sensível, fique alerta: tomar uma aspirina depois de beber pode fazer o seu estômago doer ainda mais.


Conclusão: FATO - para prevenção e cura se isentos de cafeína e acetaminofeno


Medicamentos vendidos sem receita


Remédios para ressaca  variam muito em preço e ingredientes e, conseqüentemente, sua eficiência também varia. Eles são classificados como suplementos alimentares, o que quer dizer que:


- contêm vitaminas e minerais
- não necessitam de uma receita
- são tomados geralmente em forma de drágeas


De acordo com a Hangover Review (em inglês), que fez um estudo sobre os muitos remédios vendidos sem receita no mercado, os únicos suplementos "aprovados pela medicina" são o Sob'r-K Hangover Stopper, o Chaser e o Uncle Rummie's Hangover Helper, pois usam as qualidades de filtragem do carvão para reduzir o número de impurezas que o organismo precisa processar (veja "Torrada Queimada", na seção anterior). O Sob'r-K Hangover Stopper é barato se comparado aos outros, usa o grau mais alto de carvão e a mistura é patenteada; portanto, a Hangover Review qualificou-o como a escolha mais inteligente. Com relação ao RU-21, que é vendido como um remédio secreto da KGB, o fabricante diz que ele não é um remédio específico para ressaca, mas um suplemento para desintoxicação. Tanto é assim que seus ingredientes principais, a dextrose, a L-Glutamina e a vitamina C, podem ser encontrados em quantias altas nos alimentos do dia-a-dia. O Rebound tem os mesmos ingredientes que o RU-21 e mais algumas outras vitaminas e extravagâncias como "suco de pó de capim de cevada", mas é basicamente uma multivitamina. O Berocca não é um remédio para a ressaca; é simplesmente uma multivitamina que promete aumentar a energia naturalmente (através das vitaminas). Esses medicamentos são vendidos nos EUA, mas não no Brasil.


O segredo da maioria destas pretensas "curas miraculosas" pode, na realidade, ser a quantidade de água que um indivíduo ingere quando as toma. Muitas requerem que se tome um comprimido (ou dois) com um copo (ou dois) de água antes de consumir bebida alcóolica, e então continuar a tomar as drágeas durante e depois de beber, com muitos copos de água. Só a hidratação diminui o risco de se ter uma ressaca grave e as vitaminas e drágeas dão a elas um pequeno - e caro - empurrão.


Conclusão: FATO - para prevenção e cura para os produtos feitos de carvão ativado;  FICÇÃO - para prevenção e cura para os produtos que não são feitos de carvão ativado.


Tempo


O único remédio para uma ressaca é o tempo. Não importa o que um indivíduo faça, o organismo ainda vai ter que limpar todos os subprodutos tóxicos deixados da noite anterior. Mas os medicamentos acima podem ajudar a apressar o processo.


Conclusão: FATO


Nenhum comentário:

Postar um comentário